segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

6 meses de... casa!?

Quando você não olha, a vida passa correndo como se em cima de uma carroça puxada por uma égua assustada, com as rédeas atiradas ao chão, e você nos seus oito ou nove anos contempla a cena lacônico do alto daquele banco. A estrada de terra vai começando a terminar, e logo ali na frente uma estrada interestadual cheia de caminhões e buracos aguarda o desespero de sua amiga eqüina e sua companhia em madeira velha carregando um candidato a tomate atropelado (nossa, nem tanto: meu pai pulou e parou ela, e tava bem longe da estrada ainda, mas esse exagero retórico é bem válido pra vida!).



Não dá pra medir senão os intervalos contínuos do tempo, porque ele passa sempre cada vez mais rápido, cada vez mais diferente (pra não dizer mais disso, ou mais daquilo por mais um pouco...). Então, eu vejo outros 5 a 6 meses atrás, e foi mais ou menos o tempo que eu posso dizer que vivi mesmo a vida de lá... findo o choque de chegar, a sensação constante de turista, a tolice de ser legal com qualquer brasileiro, acostumar com a estupidez a que qualquer estrangeiro precisa se acostumar em qualquer lugar, também deixar de ser chato com qualquer brasileiro (afinal, são picos e vales - e quem achar que é nacionalista sendo legal com qualquer um que aparece, vai lá e boa sorte!). E foi isso... alguns meses até saindo com portugas, quase apanhando de brasileiro por isso (ou saindo com brasileiros pra quase ser assaltado por portugas, arrastão no metrô, whatever)... porque na verdade somos abismos um para com os outros, e estava tão próximo de um lado como de lado algum, não?



Mas o que foram esses seis meses agora? Eu diria que o princípio foi uma grande paulada. Super legal voltar, afinal é sempre bom voltar, mas acho que são poucos que estão prontos pra pensar nisso: o mundo continuado sem você, por meses e meses. E depois de algum tempo meio ermo, você quer retomar tudo e ir a todo fôlego... até quebrar a cara com isso também! E um dia alguém me perguntou como tava indo tudo, e eu nunca fui tão sincero em dizer que estava trabalhando pra pagar as contas e só. Incrível ganhar o dobro do que a sua bolsa lá, e a vida ser mais vazia... até mudar pra outro emprego ainda, e ela continuar meio parada. Era qualquer coisa de lá, parecia mesmo o ar, que era completamente diferente, o tempo todo. Foi só no fim do ano que parei pra pensar nas coisas, e depois pra ler mais Álvaro de Campos (ah, droga maldita a poesia!), que eu realmente me localizei (em algum lugar da Lisbon Revisited de 1926).



Adianta alguma coisa por uma mochila nas costas e voltar? Não. Lá agora é como cá... é pegada pra trás, é história marcada, é passado e é bonito. Havia, de facto, uma loucura inerente, que era o ar diferente que tanto respirava. Todo ar vicia... um dia o mofo do taco é imperceptível a quem mora na casa, assim é também a loucura e a beleza, das coisas, das pessoas, dos dias, do mundo. E agora vamos parar com esses clichês construtivistas!



Eu já quis morar no meio da Europa pra receber amigos mochilando e trabalhar na Paulista... foram uns sonhos bestas que imaginei uns poucos anos atrás. Bom, eu morei no Sul dela (com umas restrições da residência quanto a visitantes) e agora trabalho no Paraíso (que não é Paulista por dois quarteirões, mas ainda tem o encontro da linha verde com a azul na estação pra eu não me esquecer de traduzir a importância econômica desse lugar pela produção das mais compressas latas de sardinhas que o engenho humano já pôde conceber).



Agora tenho pensado em novos planos, mas nenhum ainda de dominar o mundo (ambição sim, mas dar um passo por vez sempre - o caminho é mais que o fim... hehe). Enquanto isso, eu continuo meus planos de poeta menor escrevendo coisas que ninguém lê, para posteridade póstuma. Conheci as rimas, as figuras de linguagem, a dificuldade de traduzir a obra dos outros, e também ignorei tudo isso quando não me interessava. De vez em quando um vinho, andar madrugada adentro com algum amigo, dizer besteiras e ouvir conselhos bestas, ficar quieto porque no fundo alguns não querem conselho maior do que um comentário besta quando a cabeça já está a mil, porque são grandes os abismos, mas são incríveis as pontes de papelão nas quais - não raras vezes - nos arriscamos pra chegar mais próximos uns dos outros, a despeito que são papelão a se desfazer na brevidade de horas. O que mais dá saudade é o que já dava lá em sentido contrário, e vai ser pra sempre assim: essas pessoas com as quais andamos noite adentro, nos perdemos em conversas, e com as quais podemos explodir em 5 minutos sem parar de falar ou não dizer nada por horas pra significar a mesma coisa. No fundo, "casa" é mais ou menos isso... era ali, é aqui, mas também nunca é de todo em parte alguma.